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Foto do escritorYasmin K.

Para todos os amigos de que me lembro #1


Borboletas nunca mais tiveram o mesmo significado depois que te conheci. Lembro bem do dia que entrei na sua vida sem planejamento nenhum, afinal, nenhuma criança de seis anos consegue planejar algo que faça sentido. Enquanto minha vó explicava para sua vizinha que precisava sair por algumas horas e que não poderia me levar, eu olhava para uma piscina no meio da sala de estar. É bizarro perceber que lembro desse detalhe, mas como esquecer da família que colocou uma piscina infantil no meio da sala de estar no início do ano. Passei a tarde naquela piscina com você, como se já te conhecesse há anos.


A cada final de semana duas crianças planejavam momentos especiais, e digo especiais porque eram absurdos aos olhos dos adultos. Tentar chegar ao segundo andar através de uma árvore na frente da sua casa, que para nós era uma grande torre a ser escalada. Criar cidades inteiras de papel, com casas e carros, para abrigar lagartas da horta da minha vó.

Enquanto criamos lares para as lagartas da horta com papéis e dobraduras, criamos memórias. Enquanto as lagartas dormiam em lares de papel no seu quarto, meu lar estava na rua da casa da minha vó.


Talvez você não saiba mas, o primeiro livro que li na vida era seu. Aprendi a jogar taco com você. Você foi a primeira extrovertida a me adotar e me apresentar a outras crianças. A primeira vez que dormi em uma barraca sobre as estrelas foi na laje da sua casa. A primeira amiga que perdi foi você.


Cada vez que nossas marcas de altura cresciam na parede, nossa mente mudava. Não conseguimos prever o que estava por vir. Ninguém nos avisou qual seria o último dia que iríamos construir casas para lagartas. Ninguém me avisou da última vez que iria à sua casa. Ninguém me avisou que a perda gradativa de alguém doeria mais do que a perda instantânea. Na verdade, não perdi você, mas sim deixei de te conhecer. Cada vez que nos víamos, eram menos palavras, menos histórias, mais novos amigos. Menos tempo para a outra…


Outras pessoas moram na sua casa agora. Nenhuma criança sobe a torre. Não há mais lagartas na horta, não há mais casas de papel. As revistas pararam de chegar na sua correspondência. Não sei andar na sua nova casa no escuro como eu fazia na casa da rua da minha avó. Na verdade, não lembro de ter entrado nela. Não sabíamos que a última vez que nos veríamos, seria a última vez.


Eu não estava lá para você no seu primeiro término de relacionamento. Você também não estava por mim. Você não estava no meu casamento, como dizíamos quando criança. Provavelmente não estarei no seu. Um dia me disseram que você me odiou por um tempo por causa de um garoto. Não sei se isso é verdade, mas se for, espero que você nunca me conte. A versão criança de nós acharia isso tão estúpido.


Te olho de longe para saber como está. Sei que gosta de baleias. Você é titia hoje, eu também sou. Ainda guardo nossas fotos e bilhetes. Ainda guardo muita memória. Te conheci por mais de uma década, se um dia ouvir sua risada de novo sei que vou reconhecer em qualquer lugar.


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